Brasil 2011 - Parte I - Chegada à Transpantaneira
Confesso, envergonhado, que a primeira vez que ouvi falar no Pantanal foi só nos anos 90, quando a novela homónima passou em
Portugal. Apesar de não seguir novelas há muito tempo, lembro-me de que o
destino aparecia como uma imensidão semi-submersa, inexplorada, com muita vida
selvagem.
Por
outro lado, há muitos anos que tinha o sonho de ver um Jaguar - Panthera onca - mas sempre achei
que era impossível. Como é que um amador poderia ver um animal esquivo e misterioso, o maior felino da América?
O
facto de em 2009 ter visto o documentário “Jaguar Adventure with Nigel Marven”,
em que a expedição andou vários dias à procura do felino no Pantanal, com
vários batedores e barcos e em que só o viram quase à última hora só serviu para confirmar
a ideia de ser praticamente impossível. Por outro lado, fiquei a saber que o
Pantanal tinha jaguares.
Em 2010, quando visitei a Birdfair em Rutland Waters, tinha ideia de questionar as empresas brasileiras que lá estivessem sobre o tema. E assim fiz.
Em 2010, quando visitei a Birdfair em Rutland Waters, tinha ideia de questionar as empresas brasileiras que lá estivessem sobre o tema. E assim fiz.
As
respostas foram espantosas. Que sim, se fosse na data certa ao local certo
havia excelentes possibilidades.
Dei
o devido desconto mas, mesmo assim, fiquei com a ideia de fazer uma
tentativa. Nessa altura, as viagens ao Brasil, sobretudo ao Nordeste, estavam na
moda por cá e eu costumava dizer que devia ser o único português que ainda lá não
tinha ido.
A
novela, o documentário e a visita à Birdfair tinham feito o seu trabalho. O Pantanal
ficou definitivamente no radar.
Tudo
se concretizou em Agosto de 2011.
Iríamos
ao Pantanal, fazendo toda a Transpantaneira de Poconé a Porto Jofre. A
Transpantaneira é uma estrada mítica, de terra batida, com 150km e 120 pontes, que fica alagada uma parte do ano. O Pantanal tem esse nome por alguma razão. A viagem tinha também alguns dias em habitat de cerrado, na Chapada dos
Guimarães e, nessa altura, quem fazia esse tour costumava também fazer uma visita de uma noite à Serra das Araras, para tentar ver a Harpia, a águia mais poderosa do
mundo.
Mas,
sejamos claros, isto das aves é tudo muito bonito, mas o objetivo da
expedição era um: VER UM JAGUAR. Sonhei muitas vezes com isso nos meses
precedentes.
O início da Transpantaneira |
O Ricardo Casarin estava pacientemente à nossa espera. Segundo me recordo, apercebeu-se de quem
éramos pelas roupas outdoor que tínhamos vestidas. Não me lembro de ver nenhum
cartaz.
Saímos
a porta e ouvimos quase de imediato:
- Frederico?”.
Uff!
Pensei. Estávamos no destino e além das malas, tínhamos também o guia. Já não
faltava tudo.
No
dia seguinte, depois do pequeno-almoço, seguimos para Poconé. É à saída
dessa vila que está o
célebre portal que marca o início da Transpantaneira. É difícil de
descrever a
sensação que temos ao ver algo que já vimos muitas vezes na tv. Parecia
que estava num documentário, só que este era o meu. Tirámos a
foto da praxe, demos uma volta de poucos minutos e seguimos. Dessa volta
recordo-me de ver, entre outras aves, um Pavãozinho-do-Pará (Europyga
helias), o tal que tem um sol nas asas.
O
destino dos primeiros dias era um hotel mais ou menos a meio da
Transpantaneira. Fomos fazendo algumas paragens no caminho e, logo desde
o início, fiquei espantado com a quantidade de aves, caimões, capivaras
e sei lá mais o quê que víamos por todo o lado. Além dos ubíquos
Tuiuiús - Jabiru mycteria - símbolo do Pantanal, numa das paragens
iniciais vimos logo Colhereiros (Ajaia ajaja), que por lá são
cor-de-rosa, Talha-mar (Rynchops Niger), Martim-pescador-matraca
(Megaceryle torquata). A lista ia aumentando e o nosso entusiasmo
também. Neste habitat os bichos estão bastante expostos.
Logo
nas primeiras horas de convívio fui-me apercebendo de que o Ricardo tinha um
entusiasmo contagiante a procurar e mostrar o que via. Tinha a mesma vontade de nos mostrar, que nós de ver os bichos. Ou seja, para um observador obsessivo como eu, foi o companheiro ideal de viagem.As capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) são omnipresentes |
Tuiuiú (Jabiru mycteria) |
Mas também me lembro de um episódio que me assombra ainda hoje. O falhanço da Garça-da-mata (Agamia agami). Essa garça é, para mim, a mais bonita da família. O azar é que também é das mais escassas e difíceis de ver, ou não fosse "da mata". Numa das viagens de barco o Ricardo viu uma uns metros dentro da margem, na sombra, e avisou "garça-beija-flor!", que é outro dos seus nomes comuns. Eu só ouvi "beija-flor" e fiquei à procura de um colibri junto ao barco. Quando perguntei "Qual beija-flor?" ele apercebeu-se que eu não estava a olhar para onde devia e disse "Frederico, caga no beija-flor, está ali a a garça!". Quando olhei, já ela se tinha escondido. Ainda hoje, sete anos depois, não a consegui colocar na lista e fico com com uma lágrima no olho.
Na última
noite nesse hotel veio à conversa o quando eu tinha gostado de ver o
Urutau-grande - Nyctibius grandis - no documentário do Nigel. Fiquei espantado quando o Ricardo
disse:
-Pois nesse caso não lhe vou mostrar “um bicho”. Vou-lhe mostrar “o bicho”.
Ou seja, ele sabia onde estava a ave que tinha aparecido na tv. Na manhã seguinte “o bicho” estava lá à nossa espera, no poiso do costume, exatamente no mesmo ramo que tinha aparecido no National Geographic. É daquelas aves que quase vale uma viagem.
#canaldoxofred
-Pois nesse caso não lhe vou mostrar “um bicho”. Vou-lhe mostrar “o bicho”.
Ou seja, ele sabia onde estava a ave que tinha aparecido na tv. Na manhã seguinte “o bicho” estava lá à nossa espera, no poiso do costume, exatamente no mesmo ramo que tinha aparecido no National Geographic. É daquelas aves que quase vale uma viagem.
#canaldoxofred
Urutau-grande - Nyctibius grandis |
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