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04 setembro 2018

Flagra no Pantanal - Parte I - Transpantaneira


Brasil 2011 - Parte I - Chegada à Transpantaneira

Confesso, envergonhado, que a primeira vez que ouvi falar no Pantanal foi só nos anos 90, quando a novela homónima passou em Portugal. Apesar de não seguir novelas há muito tempo, lembro-me de que o destino aparecia como uma imensidão semi-submersa, inexplorada, com muita vida selvagem.
Por outro lado, há muitos anos que tinha o sonho de ver um Jaguar - Panthera onca - mas sempre achei que era impossível. Como é que um amador poderia ver um animal esquivo e misterioso, o maior felino da América?
O facto de em 2009 ter visto o documentário “Jaguar Adventure with Nigel Marven”, em que a expedição andou vários dias à procura do felino no Pantanal, com vários batedores e barcos e em que só o viram quase à última hora só serviu para confirmar a ideia de ser praticamente impossível. Por outro lado, fiquei a saber que o Pantanal tinha jaguares. 
Em 2010, quando visitei a Birdfair em Rutland Waters, tinha ideia de questionar as empresas brasileiras que lá estivessem sobre o tema. E assim fiz.

A "minha" Onça-pintada (Panthera onca)
As respostas foram espantosas. Que sim, se fosse na data certa ao local certo havia excelentes possibilidades.
Dei o devido desconto mas, mesmo assim, fiquei com a ideia de fazer uma tentativa. Nessa altura, as viagens ao Brasil, sobretudo ao Nordeste, estavam na moda por cá e eu costumava dizer que devia ser o único português que ainda lá não tinha ido.
A novela, o documentário e a visita à Birdfair tinham feito o seu trabalho. O Pantanal ficou definitivamente no radar.

Tudo se concretizou em Agosto de 2011.
Iríamos ao Pantanal, fazendo toda a Transpantaneira de Poconé a Porto Jofre. A Transpantaneira é uma estrada mítica, de terra batida, com 150km e 120 pontes, que fica alagada uma parte do ano. O Pantanal tem esse nome por alguma razão. A viagem tinha também alguns dias em habitat de cerrado, na Chapada dos Guimarães e, nessa altura, quem fazia esse tour costumava também fazer uma visita de uma noite à Serra das Araras, para tentar ver a Harpia, a águia mais poderosa do mundo. 
Mas, sejamos claros, isto das aves é tudo muito bonito, mas o objetivo da expedição era um: VER UM JAGUAR. Sonhei muitas vezes com isso nos meses precedentes.

O início da Transpantaneira
Depois da viagem cansativa, que incluiu uma espera prolongada em São Paulo, a noite já ia avançada quando chegámos a Cuiabá, capital do Mato Grosso.
O Ricardo Casarin estava pacientemente à nossa espera. Segundo me recordo, apercebeu-se de quem éramos pelas roupas outdoor que tínhamos vestidas. Não me lembro de ver nenhum cartaz.
Saímos a porta e ouvimos quase de imediato:
- Frederico?”.
Uff! Pensei. Estávamos no destino e além das malas, tínhamos também o guia. Já não faltava tudo.

No dia seguinte, depois do pequeno-almoço, seguimos para Poconé. É à saída dessa vila  que está o célebre portal que marca o início da Transpantaneira. É difícil de descrever a sensação que temos ao ver algo que já vimos muitas vezes na tv. Parecia que estava num documentário, só que este era o meu. Tirámos a foto da praxe, demos uma volta de poucos minutos e seguimos. Dessa volta recordo-me de ver, entre outras aves, um Pavãozinho-do-Pará (Europyga helias), o tal que tem um sol nas asas. 

As capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) são omnipresentes
 O destino dos primeiros dias era um hotel mais ou menos a meio da Transpantaneira. Fomos fazendo algumas paragens no caminho e, logo desde o início, fiquei espantado com a quantidade de aves, caimões, capivaras e sei lá mais o quê que víamos por todo o lado. Além dos ubíquos Tuiuiús - Jabiru mycteria - símbolo do Pantanal, numa das paragens iniciais vimos logo Colhereiros (Ajaia ajaja), que por lá são cor-de-rosa, Talha-mar (Rynchops Niger), Martim-pescador-matraca (Megaceryle torquata). A lista ia aumentando e o nosso entusiasmo também. Neste habitat os bichos estão bastante expostos.  
Logo nas primeiras horas de convívio fui-me apercebendo de que o Ricardo tinha um entusiasmo contagiante a procurar e mostrar o que via. Tinha a mesma vontade de nos mostrar, que nós de ver os bichos. Ou seja, para um observador obsessivo como eu, foi o companheiro ideal de viagem.

Tuiuiú (Jabiru mycteria)
Os dias passados nesse hotel, a meio do percurso, funcionaram como um aperitivo para o resto da aventura. Como pontos altos recordo-me dos passeios de barco e de ver os cinco martins-pescadores presentes da América-do-Sul. 
Mas também me lembro de um episódio que me assombra ainda hoje. O falhanço da Garça-da-mata (Agamia agami). Essa garça é, para mim, a mais bonita da família. O azar é que também é das mais escassas e difíceis de ver, ou não fosse "da mata". Numa das viagens de barco o Ricardo viu uma uns metros dentro da margem, na sombra, e avisou "garça-beija-flor!", que é outro dos seus nomes comuns. Eu só ouvi "beija-flor" e fiquei à procura de um colibri junto ao barco. Quando perguntei "Qual beija-flor?" ele apercebeu-se que eu não estava a olhar para onde devia e disse "Frederico, caga no beija-flor, está ali a a garça!". Quando olhei, já ela se tinha escondido. Ainda hoje, sete anos depois, não a consegui colocar na lista e fico com com uma lágrima no olho. 
Na última noite nesse hotel veio à conversa o quando eu tinha gostado de ver o Urutau-grande - Nyctibius grandis - no documentário do Nigel. Fiquei espantado quando o Ricardo disse:
    -Pois nesse caso não lhe vou mostrar “um bicho”. Vou-lhe mostrar “o bicho”.
Ou seja, ele sabia onde estava a ave que tinha aparecido na tv. Na manhã seguinte “o bicho” estava lá à nossa espera, no poiso do costume, exatamente no mesmo ramo que tinha aparecido no National Geographic. É daquelas aves que quase vale uma viagem.

#canaldoxofred 

Urutau-grande - Nyctibius grandis

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