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29 janeiro 2023

Savacu em Faro

19/05/2020 - Faro - Savacu-de-coroa

Depois de uma bem sucedida corrida ao Trombeteiro do Espichel - ver "A Trombeta do Desconfinamento" - apareceu uns dias depois nessa mesma zona um andorinhão-pequeno (apus affinis). Foi a 18 de Maio, segunda-feira, nove dias depois da aparição do Trombetas. É um fenómeno que se explica pela quantidade de olhos que passam a frequentar um local quando o mesmo está "quente" ou "on fire", como alguns preferem dizer em Português corrente.
Segui o tema com interesse, mas sem grande intenção de me deslocar, mais uma vez, ao Cabo. A semana ainda era longa. No entanto, acabei por me deixar convencer, sem grande esforço, a ir ajudar o Vasco Valadares a descobrir o animal. No dia seguinte, terça-feira, tinha um intervalo entre reuniões entre as 10h30 e as 14h30. "Vou lá contigo, mas tenho de estar em casa às 14h15". E assim se fez. Pouco depois das 10h30 estávamos a sair do quartel-general. Objetivo, Affinis. Lá iam ser mais umas horas a olhar para o céu, com o pescoço e os ombros a doer, já para não falar da peregrinação a pé da barreira na estrada até ao Santuário. O corpo a pagar e, ainda por cima, sem ter feito nenhuma promessa.

Savacu-de-coroa (Nyctanassa violacea)

Pouco depois das 11h, tínhamos acabado de atravessar a 25 de Abril quando, numa das várias consultas por minuto que faço ao smartphone, vejo um post do Georg Shreier no grupo "Rare Birds Algarve". Só dizia "Red alert in Faro" com um link para uma lista do eBird. Cliquei imediatamente no link, cheio de curiosidade. Realmente, não era uma lista qualquer. Só tinha uma espécie mas, que espécie. Era um Savacu-de-coroa (Nyctanassa violacea). Um adulto a descansar, calmamente, nas escadas da doca, em frente ao Hotel Eva, às 8h15. O Observador - Nuno Sales Henriques - era desconhecido mas, as fotos tiradas com o telemóvel (!?) não deixavam dúvidas a ninguém. Dizia ele nas notas que tinha tido dúvidas na espécie mas que após consulta com um amigo, tinham chegado a essa incrível conclusão.
Aguenta coração! Não havia dúvidas na espécie e o local também parecia estar mais que confirmado, com as fotos apresentadas. Ou seja, não havia mesmo como escapar a esta. Ainda por cima, para mim, esta garça tinha uma certa mística, uma vez que só na quarta viagem ao Brasil a consegui finalmente vislumbrar. Só um juvenil mas, tomaram muitos!
Tentei manter a calma, enquanto contava ao Vasco o que tinha acontecido. Sentia a adrenalina a espalhar-se rapidamente pelas veias. A resposta veio imediatamente:
-Seguimos em frente?
Perante a minha hesitação, ainda pôs sal na ferida:
-Não precisas de decidir já. Tens até à saída para Sesimbra.
Realmente, tinha imenso tempo para decidir com calma. Para aí uns cinco minutos. As contas de cabeça começaram. Como iria conseguir baldar-me ao teletrabalho? Não deixa de ser cómico pensar nisso. Uma pessoa já está fora do escritório. Neste caso estamos a falar de estar fora de estar fora do escritório. À reunião das 14h30 era difícil fugir. Às outras nem tanto e, com uma chamada, avisei que tinha tido um "imprevisto" e não ia estar presente. A verdade é que esta forma de trabalhar também tem as suas vantagens. O facto de se estar nas reuniões sempre de forma virtual, significa que podemos estar fisicamente onde quisermos. Parti do princípio que teria boa rede móvel na doca de Faro e achei que era uma boa forma de testar a app de reuniões no telemóvel. Estava decidido!
-'Bora para Faro!

Red Alert in Faro!
(screenshot do facebook)

O caminho não teve grande história, a não ser um telefonema rápido do Pedro Ramalho. A Reuters do birding Português tem sempre de ter as últimas informações. Atendi e, depois de atender, houve ou dois segundos de silêncio. Veio a pergunta, que soou mais como uma afirmaçāo: 
-Já estás a caminho...
Perante a minha hesitação prolongada na resposta, teve de insistir:
-Eh pá, ou estás, ou não estás.
Hesitei mais uns segundos.
-Bem...Sim.

Ao fim de quase duas horas e meia estávamos a estacionar ao lado da doca, junto às escadas onde a foto da lista ebird tinha sido tirada. Vista já tínhamos. Só faltava o bicho. Esse, tal como era esperado, não estava à vista. 
Rapidamente avistámos o Lars Gonçalves e a Susana Almeida. Andavam a explorar as redondezas. Além deles, não vimos mais ninguém da tribo. A multidão estaria com certeza a caminho ou, será que é a tribo que é pequena?

Às 14h30 em ponto fui para o carro e entrei na reunião. Ouvia-se tudo perfeitamente e ninguém se apercebeu que não estava num local convencional de trabalho. Obviamente que o pessoal em Faro achou imensa piada ao facto de eu estar sentado dentro do carro com o telemóvel na mão e fones nos ouvidos. Lá tive de repetir várias vezes o pregão "Não vês que estou numa reunião?". 
Pouco depois das três da tarde já estava despachado. Tinha corrido tudo impecavelmente. Benditas novas tecnologias. Às vezes, ponho-me a pensar que ainda há dois ou três dias usávamos telefones de disco. Outros tempos e outros mundos...

Voltando ao mundo real ou, neste caso, à Doca de Faro, as notícias não eram boas. O Savacu na doca não estava e nos jardins adjacentes também não, pelo menos que se visse. 
O pessoal do sofrimento foi chegando a conta-gotas. O Nuno dos Santos, o não-arrolador  Nelson Fonseca e outros foram-se juntando. Já lá tínhamos um grupo jeitoso e a conversa estava animada. Tudo com o devido distanciamento social, claro. 

Sem sinal do bicho, resolvemos ir comer qualquer coisa. Fomos ao restaurante de luxo que tem como logotipo dois arcos dourados a formar um M. "Se aparecer avisem!".  Os restaurantes estavam a começar a reabrir, depois do choque pandémico. Este não fugia à regra. Os funcionários ainda mal sabiam como usar a máscara, e os clientes também. Tudo muito estranho, parecia mais um episódio da Twilight Zone. Mas estranhos num mundo estranho já os birders são há muito tempo e, por isso, no nosso caso tratou-se apenas de mais um detalhe da história maior.
Voltámos à doca. A conversa continuava animada. Num instante chegámos as cinco da tarde. O pessoal começava a desmobilizar. Lá para as sete, já só estavamos eu, o Vasco, o Lars e o Nuno dos Santos. "Eu já não acredito!", Dizia o Nuno. "Tens de acreditar sempre", foi o que lhe disse. 
No meu caso, já tinha ido de Lisboa, agora era ficar até ao fim. Com uma garça noturna, não faz sentido ir embora de dia, sem esperar pela noite. Teria sido o La Palice a dizer isso?  De qualquer maneira, quem já tinha feito 300km, bem que podia esperar mais duas horas, ou não podia?
Continuámos a mandar palpites. "Se calhar está dentro de um barco", "Ainda há bocado vi restos de comida dentro daquele.", "Isso era de uma lontra", "Pois, se calhar até era." 
A verdade é que o bicho não aparecia, por muito que olhássemos para o quadrado de água rodeado pelas paredes de pedra branca. Mais um suspiro e, lá fomos ficando. Fomos ficando e, lentamente, chegámos às 8 da noite.

O sol já começava a desaparecer quando se vê um vulto a voar pelo meio da doca, por entre os barcos. Vinha do lado da cidade, do jardim. A primeira voz que se ouviu foi a do Nuno. "Olha! É a gaja!". Rapidamente foquei a vista e apontei os binóculos. Não tive dúvidas. Vi-a pousar num barco, junto ao bar dos pescadores, no lado sul. Lá fomos, uns a correr, outros, como eu, a fingir que corriam. Antes disso, ainda tirei umas fotos, não fosse o diabo tecê-las.
Lá estava ela, em cima do barco com a cobertura amarela. Mais umas fotos e, nem trinta segundos depois, levanta e vem pousar mesmo por baixo de nós no paredāo inclinado. O pessoal estava em transe. Foi disparar como se não houvesse amanhã. E filmar, como é que havia de fazer? Como tinha começado o dia a pensar que ia fotografar um andorinhão ao Espichel, não tinha trazido a bridge, nem o tripé. Filmar com uma câmara normal dslr e a lente 400mm, sem apoio, estava fora de questão. Restava o telemóvel. E foi com o que restava que acabei por fazer um pobre registo do bicho. Foi o que se pôde arranjar. Tinha ido ao Brasil para ver esta garça e, a custo, lá vi um juvenil. Agora via um adulto em Faro, e que até dava para filmar com o telemóvel. Irónico  é dizer pouco. De rir foi quando coloquei esse vídeo no canal e me perguntaram porque é que estava na vertical. "Filmado com o telemóvel?!". Há dias assim, em que dá para tudo.


O filme com o telemóvel

Nem cinco minutos tinham passado quando aparece o anterior desistente, Nelson Fonseca, em pijama e chinelos. "Já estava a Jantar!" 
Há sempre uma primeira vez para tudo. Não é todos os dias que se vê um pijama nestas andanças.
Depois do transe inicial começámos lentamente a aperceber-nos do que nos rodeava. A verdade é que a garça podia ter escolhido ir para qualquer ponto da doca mas resolveu ir passear precisamente para a frente do bar de pescadores local. Aí, a curiosidade imperava. "O que é que estão a ver?", "Amaricana?", "Olhem que depois têm de vir aqui fazer o relatório!". Os frequentadores habituais estavam quase tão entusiasmados como nós. Até a empregada Algarvia quis saber do que se tratava. "Primeira vez na Europa?", "Então e veio para aqui porquê?", "Era mandar-lhe uma pedrada!", dispara outro lá de trás. Ora aí está o crítico cá do sítio, pensei.

Quando comecei, finalmente, a conseguir raciocinar e a articular o discurso lá me virei para o Nuno:
-E agora, já acreditas?!

O regresso era longo e às nove e pouco já estávamos a caminho de casa. Além da habitual paragem na habitual área de serviço, retenho a frase do Vasco:
-Foi um dia espetacular, não foi?
Só nessa altura fiz o flashback na minha cabeça. Do trabalho para o Espichel, ou não-Espichel, neste caso. Da ponte sobre o Tejo para a doca de Faro. A reunião virtual e a montanha russa psicológica até à aparição.
Não sei se foi por ter ido ao Allgarve que me veio à cabeça a frase do Lord Marshal no filme que também tem crónicas no título: "This is a day of days!". E foi. Foi um dia que valeu por mil.








20 janeiro 2023

A Mariquita da Vitória

Terceira 17 a 19 de Dezembro de 2022

Dezembro de 2022. Em termos de viagens, para mim o ano estava arrumado. A loja estava fechada. Mas como de boas intenções está o mundo cheio, dia 4 estava eu muito descansado no sofá quando fui desencaminhado mais uma vez pelo Rúben Coelho. Não vens? Temos cá o Galeirão e a Mariquita. Farto de saber isso estava eu mas, estava a tentar não cair em tentação. 
 
Mariquita-de-mascarilha (Geothlypis trichas)
Mariquita-de-mascarilha (Geothlypis trichas)
de costas...





 
Fui consultar os voos e, espantosamente, no fim de semana de 17 de Dezembro nem estavam excessivamente caros. Vá-se lá saber porquê. O resto da logística foi relativamente simples de tratar. Parecia que os astros se alinhavam e não foi preciso muito mais para me auto-convencer. Afinal, eu era um homem ou um rato? Fiquei rapidamente sem desculpas. Estava decidido. Foi assim,  com menos de duas semanas de antecedência e empurrado por quase toda a gente que marquei a viagem. Se é que se pode chamar viagem a uma estadia de um dia completo e dois meios dias. Iria a 17 e viria a 19. Era pouco tempo mas, tomaram muitos! Quando comuniquei a decisão ao meu outro cúmplice da Terceira, o Carlos Pereira, a resposta foi pronta, "Já estava a estranhar!". Afinal, parece que o único que não sabia que ia à Terceira em Dezembro era eu. 

Apesar de, teoricamente, os objetivos serem dois, na minha cabeça só via um deles como possível, o galeirão-americano - Fulica-americana. Tradicionalmente, esse costuma ficar semanas nos locais onde é descoberto. Já no caso da mariquita-de-mascarilha - Geothlypis trichas - pensei sempre que não iria acontecer. Bicho furtivo e que já tinha sido descoberto há mais de duas semanas (dia 18 de Novembro pelo próprio Rúben). A sorte, mesmo a grande, tem limites. Nesta atividade não há impossíveis mas, não era, em princípio, possível que essa jóia lá ficasse mais de um mês à minha espera. 

Os poucos dias que faltavam foram passando muito lentamente. Fui seguindo as notícias que caiam a conta-gotas daquele pontinho verde perdido no meio do oceano. O galeirão por lá continuou e, espantosamente, a mariquita também. A esperança, foi crescendo, lentamente, algures lá nos confins mais profundos da consciência e do subconsciente. Apesar tentar não pensar nisso, volta e meia essa mariquita aparecia nos meus sonhos. 

Faltava menos de uma semana quando tudo se começou a complicar. Começou a perceber-se que as previsões meteorológicas não estavam grande coisa para o fim de semana. Leia-se, havia aviso amarelo de vento para os Açores. Comecei logo, na minha cabeça, a fazer o filme de que não iam haver voos para mim. Da mariquita não havia notícias desde dia 8 e até aí tudo normal, era mais que esperado. A gota de água foi quando, precisamente no dia anterior à partida, o Carlos Pereira me dá a excelente notícia que tinha tentado ir nesse dia ver o galeirão sem sucesso. Sem vôo, sem mariquita e sem galeirão, era precisamente assim que estava, a horas de sair de casa. A desilusão instalou-se durante umas horas. Troquei umas mensagens, a queixar-me da vida, com os companheiros já referidos. Não que isso ajudasse em alguma coisa mas, há que ter um escape em qualquer lado.

A verdade é que, de repente, assim como chegou, a tempestade mental que tinha dentro de mim desapareceu e senti uma tranquilidade difícil de explicar. Aceitei o destino, o que tivesse de ser, seria. A última mensagem que enviei nessa noite foi algo do tipo "Só sei que amanhã vou para o aeroporto, depois logo se vê." E o sono foi tranquilo, contrariamente ao que é costume nas vésperas de viagem.

Finalmente o sábado esperado chegou. Fui para o aeroporto e para a porta atribuída. Não havia avisos de atraso nos monitores. Não vi passageiros stressados ou a mencionar algo sobre cancelamentos do voo. Chegou a hora do embarque, fizeram a chamada, fomos para os autocarros e embarcámos no avião. Parecia impossível. Exatamente à hora marcada, fizeram o pushback e cinco minutos depois estávamos a caminho. O avião era um luxo, um A330 com televisões multimédia e tudo. Até vi um filme durante a viagem. O comandante avisou que íamos ter turbulência na aproximação e aterragem. Bate certo, pensei. O primeiro passo estava feito. Próximo passo, conseguir aterrar.

O avião abanou um bocado e a aterragem foi na diagonal, uma roda de cada vez. Difícil, mas foi logo à primeira. Lá falhava mais uma das minhas precisas previsões. Menos de meia hora depois já estava no carro, com os meus amigos. Agora, era uma questão de os bichos colaborarem.

O tempo não estava famoso. Fomos primeiro ao Paúl da Praia da Vitória à procura da mariquita mas ela não quis nada connosco. Bem que nós a procurámos mas, nada feito. Finalmente, uma previsão que batia certo. Ah e tal será da chuva, será do vento? As conversas do costume. I'll be back, foi o que me ocorreu. Dali já não esperava nada mas, nesta atividade é proibido desistir.

Próxima paragem, Lagoa do Junco, à procura do galeirão-americano. Naquela zona mais alta o tempo estava ainda pior. Além do vento e da chuva também tínhamos o nevoeiro a ajudar. Para chegar ao sítio tivemos de caminhar uns bons duzentos metros na lama. Chegámos à charca por volta das três da tarde e começámos à procura. Com as mãos a tremer, fosse do frio ou da excitação, dei uma ou duas voltas com os binóculos e não vi nada de especial. Será que o bicho já se tinha ido de vez? Ouço então a palavra da salvação, neste caso a do Rúben, à minha esquerda, "Está lá! Está lá!". "Onde?", perguntei, com o coração aos pulos. "Ali, junto ao muro!". Lá o vi, a uns duzentos metros. Estava quase encostado ao muro de pedras para se proteger do vento. Mal percebeu que estava a ser observado, foi para o meio da charca, para trás das ervas, que estão por todo o lado. Passados apenas uns segundos quase que nem a cabeça se via. A camuflagem era quase perfeita. Este bicho era um estratega. Percebi imediatamente porque teria sobrevivido desde o início de Novembro sem servir de troféu a um dos muitos caçadores que visitam a zona. Tirei umas fotos fraquíssimas de registo dei o assunto como encerrado. O tempo e o bicho não permitiram mais. Senti o alívio instalar-se lentamente, um calor interior difícil de explicar. A viagem não tinha sido em vão. Vi que o Rúben também estava contente, e não era para menos. A hospitalidade da Terceira não podia ser posta em causa. 

Galeirão-americano (Fulica americana)

 O galeirão já estava. Nesse dia já não tínhamos muito mais tempo até a luz desaparecer e resolvemos dar mais umas voltas pelos arredores. Não apareceu nenhuma surpresa mas, pelo menos, viu-se tudo o que já se sabia que andava por lá. Já se sabe que além da natureza, que é muito bonita, há sempre alguma passarada americana para compor qualquer visita.

No final do dia, o Rúben foi à sua vida, e eu fui à minha. O apartamento onde fiquei na capital do Birdwatching na Terceira - leia-se Praia da Vitória - estava muito bem situado. Perdido no meio do casario e a meio caminho entre o Paúl e a marginal. Senti-me em casa. Por um momento imaginei que vivia ali. Era apenas mais um dos residentes e não um estranho, um continental maluco dos pássaros. 

Hora de jantar. Desci para a marginal só para me aperceber do que parecia ser uma tempestade de areia. O vento era tal que, mesmo os grãos pesados daquela praia formavam uma nuvem e picavam a cara e as mãos de quem se aventurava na rua, como eu. Entrei rapidamente para jantar num dos restaurantes. A meio da refeição comecei ver o reflexo de uns pirilampos azuis na rua. O que se estaria a passar? Nem cinco minutos depois, aparece um operacional da proteção civil a pedir para quem tivesse carros na zona os ir retirar. Eh lá! Isto não parece estar fácil, pensei. Quando saí do restaurante havia postes com iluminações de Natal torcidos e deitados ao chão, a rua estava cortada e o jipe da proteção civil estava na zona. A tempestade de areia continuava. Ou seja, não era o fim do mundo, versão Praia da Vitória, mas imitava bem. Fugi a sete pés para o quartel general, que aquilo não estava famoso. Afinal o tal aviso amarelo sempre significava qualquer coisa.

Proteção civil em ação
 
Domingo, o Rúben apareceu cedo para começar a labuta. Fomos logo de manhã e ao fim da tarde ao Paúl da Mariquita, mas a Mariquita não quis aparecer. Ouvi-o dizer, quase para dentro, "Já tive mais fé...". Para mim o facto estava consumado e, a Mariquita, perdida. "É o que é", pensei. Aproveitou-se o dia para dar a volta à ilha. Uma visita a Meca - Paúl da Pedreira - não podia faltar. O balanço do domingo foi um bom conjunto de patos, limícolas e gaivotas americanas, além de um dos meus bichos preferidos, também do mesmo continente, o mergulhão-caçador. 

E foi assim que chegámos a segunda-feira, dia da despedida. O avião era só ao meio-dia e, por isso, já tinha decidido que logo de manhã cedo iria ao Paúl da Praia cumprir a minha obrigação e tentar outra vez a famigerada mariquita. A já falada crença do touro. Acordei cedo e fui tomar um bom pequeno almoço a uma panificação lá do sítio. Sim, porque isto das padarias portuguesas não foi inventado agora. Já tinha feito isso no dia anterior e, apesar de ser longe, dava-me um certo gozo atravessar a cidade ainda adormecida, com as ruas vazias. Isto, claro, com exceção da tal panificação já referida e da taberna da zona, onde os frequentadores habituais me lançaram olhares mistos de curiosidade e reconhecimento. Era a segunda vez em dois dias que me viam passar por ali à mesma hora. Já era praticamente da casa. Bebia era café em vez de bagaço. No regresso ao apartamento senti uma tranquilidade imensa. As ruas estavam desertas e mostravam os desenhos da calçada, iluminados pelas luzes dos candeeiros. Arte urbana no seu melhor. O sol ainda vinha longe, mas já se fazia anunciar. Um pouco como quando estás na paragem de metro e ele começa a querer aparecer, com o som longínquo que se propaga pelo túnel. Não o vês mas, sabes o que aí vem. Pelo meio do casario via-se, por vezes, o mar iluminado pelo início da alvorada. Sentia-me um privilegiado por poder ver este espetáculo simples e complexo ao mesmo tempo. 

Praia da Vitória
uma rua só para mim...


 

Depois de um passeio matinal que me encheu a alma, saí de casa num estado completamente Zen. Raras vezes me sinto assim, o que fez com que me sentisse espantado por me sentir assim. O Paúl era logo ali ao lado e nem cinco minutos demorei a chegar. Passava pouco das oito horas, o sol estava a nascer. Tinha cerca de duas horas para esta última tentativa e tencionava usá-las o melhor possível. A esperança era nenhuma mas, trabalho é trabalho. Para chegar ao local exato onde a mariquita tinha aparecido mais vezes, era preciso andar no jardim cerca de cem metros, saltar um muro e andar mais uns cinquenta num prado, ou pântano adjacente. A nomenclatura varia conforme a quantidade de água que lá está. Bom, adiante, passei o jardim dos aromas e cheguei ao muro. A luz dourada dos primeiros raios de sol iluminava a cena. Lembrei-me de apontar, logo dali, os binóculos para os arbustos onde o bicho costumava aparecer. Mal acreditei no que vi. Lá estava a estrela nos arbustos e no chão a alimentar-se. Mais um unicórnio que se materializava à minha frente. Olhei múltiplas vezes para os binóculos para ver se não estava a sonhar. Continuava a vê-la, era mesmo verdade. Ainda por cima é um bicho bonito, com a garganta amarela e a mascarilha preta. 

O pânico instalou-se quando me lembrei que tinha de documentar o acontecimento ou ninguém iria acreditar em mim. Tanta procura nos dias anteriores sem sucesso e de repente aparecia alguém a dizer que a tinha visto sem evidência nenhuma? Está-se mesmo a ver... Como costumo dizer, na minha lista acredita quem quiser mas, mesmo assim, com evidência não há conversa. Levantei a máquina e apontei para a zona geral, sem saber muito bem se tinha apanhado alguma coisa - soube mais tarde que não - e saltei rapidamente o muro para me aproximar do local. Com o coração aos pulos, tentei não acelerar muito, para não espantar a bicharada. Bicho muito discreto, ora aparecia ora desaparecia entre os arbustos e o chão. Finalmente, lá consegui uns registos fracos junto ao solo e com quase nenhuma luz. Já era alguma coisa. Finalmente, pousou por uns segundos no arame farpado e permitiu qualquer coisa melhorzita. Maldita máquina, que só a focou quando já estava de costas. Era o que havia mas, tomaram muitos! Rapidamente, saiu do arame e desapareceu, para ir à sua vida. E eu, eu fiquei a pensar também na vida, e em como as coisas acontecem. Quando vinha do pequeno almoço, nem nos sonhos mais recônditos imaginava o que se iria passar dali a uma hora.

Mariquita-de-mascarilha (Geothlypis trichas)
um dos primeiros registos dessa manhã

Desde a primeira foto que tirei a partir do muro, até à última, no fio, mediaram doze minutos. Uma montanha russa de emoções, da tranquilidade absoluta, à incredulidade, ao pânico, ao alívio e finalmente, à satisfação infinita, tudo em doze minutos. É assim que funciona, este ofício. Quando mandei uma foto para o Rúben e para o Carlos penso que também ficaram espantados. Provavelmente já não esperariam voltar a receber notícias deste bicho. 

Passado mais de meia hora apareceu o Carlos. Ainda andámos mais um bom bocado à procura da mascarilha, mas ela não voltou a aparecer. Era hora de voltar para casa. Fui buscar a trouxa e o uber Carlos Pereira levou-me ao aeroporto. Estava nas nuvens, e foi nas nuvens que voltei para casa. O impensável tinha acontecido e todas as minhas previsões de sexta-feira à noite tinha saído furadas, felizmente. 

Resta-me agradecer ao meu amigo Rúben, incansável, que me desencaminhou, e ao meu amigo Carlos, sempre presente, mesmo estando severamente condicionado nesses dias. Mais uma vez, senti-me em casa na Terceira. Agradeço também ao Rúben a contribuição que finalmente permitiu dar um título a esta crónica. Não estava fácil.

#canaldoxofred

03 janeiro 2023

As Anãs do Carvoeiro

Peniche 10/12/2022 e 11/12/2022

Se há aves quase impossíveis de colocar numa lista por estas bandas, uma delas é, sem dúvida, a torda-anã (Alle alle). É frequentadora de latitudes muito mais a norte e tem, como seria de esperar, muito poucos registos em Portugal. Ou seja, não é um mito, mas quase. 

Em Dezembro de 2022 os dias de vento forte e mar alterado continuavam desde há semanas atrás. Na tribo só se falava em observação de aves marinhas. As visitas aos hotspots habituais estavam no auge, bem como a vigilância nos portos e estuários. Já tinham sido avistadas muitas aves interessantes. Algumas gaivotas-de-sabine, muitos falaropos e a invasão de gaivotas-tridáctilas são alguns dos destaques. Isto é tudo muito bonito mas, a chamada mega ou bomba ainda não tinha feito a sua aparição. Seria uma questão de tempo? As dúvidas do costume andavam na boca de toda a gente, como a tal pasta do anúncio.

Torda-anã (Alle alle)

Dia 9 de Dezembro, uma sexta-feira de trabalho a seguir ao feriado de quinta, o Pedro Ramalho atira para o ciberespaço uma bomba atómica. Tinha visto uma torda-anã a uma distância aceitável no Cabo Carvoeiro, a voar para Sul. A única evidência que apareceu foi uma foto de um maluco no supermercado a comprar doritos tex-mex. Não sei se conta, mas eu acreditei. A legenda incluia uma frase parecida com "Foram catorze anos à espera deste momento". 

Quem espera sempre alcança. Não tenho dúvidas que, em esforço e tempo dispendido a olhar para o mar desde 2008, o Pedro é dos que mais esperou de entre os observadores Portugueses. Para se ver aves especiais há que acreditar mesmo que é possível, e investir tempo, mesmo muito tempo. A vida é injusta e nem sempre é a quem merece que as coisas acontecem mas, neste caso, até foi.

Agora, havia que decidir o que fazer no dia seguinte, sábado. Obviamente que nunca, nem nos meus sonhos mais recônditos, pensei que seria possível ver uma Alle alle. O que passou passou. Bombas atómicas só há uma em cada século. O vencedor do euromilhões desse ano estava encontrado. Mesmo assim, havia que decidir onde ir. Ou seja, como estamos a falar de marinhas, tinha de decidir entre o Cabo Raso e o Cabo Carvoeiro. Acabei por me decidir pelo Carvoeiro, em parte influenciado pelo Pedro Nicolau, que não tinha vontade de ir ao Raso. Apetecia-me pôr a conversa em dia com o emigrante que andou lá fora a lutar pela vida. Assim se fez e, no início da manhã, lá estávamos os dois no Carvoeiro. A passagem estava razoável, nada de excecional. Já tive dias com muito mais bichos a passar no Cabo. A meio da manhã chegou o dono da zona para controlar a situação e lá ficámos os três junto à Cruz dos Remédios. A observação foi alternando com a amena cavaqueira até ao momento em que eu e o Pedro Ramalho pusemos a vista em cima de um bicho esquisito que seguia isolado, não muito distante da costa. "O que é aquilo?" Foi a minha pergunta imediata. Era um alcídeo, mas pequeno, com vôo mais lento do que as tordas, airos e papagaios-do-mar que andávamos a ver nessa manhã. Ouço o Pedro Ramalho a soltar exclamações do tipo "Eh pá! Pronto! Eh pá! Como é possível?". A observação foi prolongada e, a pouco e pouco apercebi-me do que estava a ver. Era mais uma bomba atómica, mais uma torda-anã. Lá seguia ela, sozinha, naquele anfiteatro imenso que é o Carvoeiro. Ainda ouvi o Pedro a dizer que gostava de comparar o tamanho e só demorou uns segundos até que o desejo fosse satisfeito. Passa uma pardela-balear ao lado, que permite ver que aquela torda era mesmo minúscula. A mim pareceu-me nem metade da pardela. A estreia estava mais que consumada mas, continuei a seguir a ave que, numa destas, provavelmente, nunca mais iria por a vista em cima. 

No meio de tanta excitação, nem tinha valorizado os gritos de desespero do outro Pedro, o Nicolau. A dada altura, já pareciam quase um choro compulsivo. "Mas onde é que está a ave? Não estou a ver a ave! Mas está onde? Não vejo!". A ladainha não parava mas, quem nunca teve desesperos destes que atire a primeira pedra. Lá tomei consciência do drama que se estava a desenrolar e comecei a dizer, repetidamente, "Ainda a tenho! Ainda a tenho! Se quiseres vem ao meu telescópio. Ainda a tenho!". O Nicolau lá percebeu que era a única hipótese que tinha. "Está bem, sai para a esquerda". Eu sair, saí. O problema foi que, quando ele se aproximou, deu um pontapé no tripé e tirou o telescópio do sítio. Eh pá, ajuda qualquer coisinha, pensei. Fosse por sorte ou por perícia, a verdade é que passaram só uns segundos até ele, finalmente, dizer que estava a ver a ave. 

Torda-anã (Alle alle)

A alegria imperou nos Remédios nos minutos seguintes. Os abraços e cumprimentos sucederam-se. Tinha sido uma sorte monumental, tão grande que até pôde ser compartilhada com mais dois companheiros, o Pedro Marques e António Gonçalves, que andavam perdidos lá na zona. Vieram para junto de nós e, passado nem dez minutos passou outra anã, a deles. Parecia impossível mas, já tínhamos entrado na twilight zone há largos minutos e, toda a gente sabe que nessa zona do crepúsculo tudo é possível. Não há fome que não dê em fartura. Já íamos na terceira torda destas em dois dias.

O dia de observação acabou com um almoço razoável na companhia dos dois Pedros e com mais um regresso triunfal a Lisboa. Estava eufórico e senti-me o melhor condutor do mundo mas, juro que só bebi uma cerveja ao almoço.

No final do dia, o Vasco Valadares tentou convencer-me a ir a Peniche outra vez no domingo. Não me apetecia muito. Torda-anã já tinha tido a minha e, a água não passa duas vezes debaixo da mesma ponte. Ele sabia bem disso mas, ficou combinado que íamos dormir sobre o assunto e que quando acordássemos, logo se via...

E logo se viu. Acordei sem pressas e decidi que ia novamente a Peniche. Não sei explicar porquê. Há razões que a razão desconhece. Não sabia o que estaria o Vasco à espera de ver mas, havia uma aberta na chuva desde meio da manhã até ao final da tarde, com ventos razoáveis. Alguma coisa haveria de aparecer, pensei.

O ritmo foi descontraido, à patrão. Fomos à Papoa, ao café do Quebrado e, passava das onze horas quando, finalmente, chegámos à Cruz dos Remédios, onde já se encontrava outro sofredor destas andanças do seawatching, o Pierre Lemos Esteves.

Mais uma vez, a passagem estava razoável. Nada do outro mundo, mas viam-se alguns alcídeos, sobretudo tordas. Um ou outro papagaio-do-mar passava mais longe, mas suficientemente perto para permitir a identificação. Gaivotas e alcatrazes qb. Não chovia nem estava muito vento e, por isso, o sofrimento não era muito.

Já passava do meio dia quando passou uma mobelha-pequena a uma distância razoável. Até deu para uma ou outra foto. Essa mobelha ainda tem estatudo de raridade e seria um excelente corolário da sessão da manhã. Como as coisas estavam a acalmar, era um excelente pretexto para podermos ir almoçar, ou não era?

A verdade é que os meus companheiros não se mexiam. Meio-dia e um quarto, meio-dia e meia. Já era uma da tarde e nem sinal de almoço. As costas doiam e a fome era negra. Acabei por me conformar com a sorte que me estava destinada e deixei o telescópio por uns momentos para me sentar no banco lá do sítio. Ora, foi aqui que o problema começou. É mais que sabido que, comigo, as coisas aparecem quando me sento ou quando estou a comer. 

Já era uma e um quarto. A passagem estava a abrandar. Olhava para os colegas e o movimento era tipo nenhum. "Eu estou bem aqui!", dizia o Pierre. E eu a pensar que vinha a Peniche almoçar. Sorte maldita!, pensei. Ora, por ironia do destino, foi precisamente nessa altura que vi qualquer coisa muito estranha a materializar-se nos binóculos. Tal como no dia anterior, o que vi foi um alcídeo com um voo mais lento do que era costume, minúsculo e com as asas a bater muito rápido. Lá senti mais uma faísca na cabeça. Qual faísca, era um relâmpago, isso sim. Mais uma torda-anã, e a passar bastante perto, muito mais perto do que no dia anterior. “O que é aquilo?” – levantei-me num ápice e perguntei com voz estridente. “Parece-me uma torda-anã”. Mal acabo de dizer isto ouço a voz do Vasco, “Onde?” “Eh pá, está ali!”, “Onde?”, “Fica atrás de mim para veres para onde estou a olhar”. Era outra vez o filme do dia anterior, mas com outros protagonistas.

Torda-anã (Alle alle)

Pode ter havido mais perguntas mas, confesso que não ouvi mais nada. Devo ter entrado em transe. Como o bicho estava a passar perto, resolvi tentar a sorte e tentar tirar umas fotos. Pensei que estava a perder o meu tempo ao largar os binóculos e pegar na câmara mas, resolvi tentar. Isto de mudar do telescópio para os binóculos, dos binóculos para a câmara e vice-versa é sempre complicado e, normalmente, implica a perda do bicho. Sabia disso tudo mas, resolvi tentar. Para meu espanto, quando olho pelo visor, o bicho estava lá. Como estava lá, carreguei no botão. Até carreguei duas vezes. De repente, deixei de a ver. Apareceu num ápice e desapareceu de repente. Lá baixei a câmara, ainda sem querer acreditar no que tinha acabado de acontecer. Só aí é que percebi que os meus dois companheiros não tinham tido a mesma sorte que eu, e não tinham conseguido perceber onde andava aquela miniatura perdida no meio do oceano. Via-se claramente a desilusão nos olhos deles. Ah e tal, que não tinham conseguido ver a estrela do momento e que pelos vistos tinha passado mais perto do que tinham pensado. É assim a vida. Muitas desculpas mas, torda, nada.

Voltei a pegar na máquina para ver se aparecia alguma coisa nos disparos. Os dedos tremiam. Para minha grande surpresa tinha sete fotos e até estavam focadas. É verdade que focadas qualquer um tira mas, mesmo assim, fiquei contente. Parecia impossível mas estavam ali à minha frente. E esta, hein?!

Mandei logo notícia do sucedido para o dono da zona, o Pedro Ramalho, que isto com proprietários não se brinca. ”Alle alle com foto." A resposta não se fez esperar "Bom, parece que vou ter de ir aí". Aproveitei para ir fazendo download das imagens para o telemóvel. A ideia era ir preparando o futuro que, isto conversa é tudo muito bonito mas, com evidência é sempre melhor. É outro campeonato. 

O inspetor da zona lá chegou, finalmente,  e claro, quis logo ver uma foto. Lá lhe mostrei o que tinha. Com um ar de gozo disse-me "Ah, isso é uma torda!". "Sim, é uma torda, mas é anã", repliquei. E lá nos rimos todos um bocado. Foi a contragosto que me obrigaram a colocar uma foto num dos muitos grupos WhatsApp da especialidade. Tudo em nome da rápida divulgação claro. A incredulidade que poderia ainda existir sobre as observações dos dias anteriores foi rapidamente esquecida quando finalmente apareceu a evidência que parecia impossível obter. Fiquei a saber que era a primeira vez que alguém teria conseguido fotografar esta espécie no mar a partir de terra e de boa saúde.

O Bullying no Carvoeiro
(foto Pedro Ramalho)

Duas da tarde. O efeito da adrenalina estava a passar rapidamente e a fome instalava-se pouco a pouco. Em vez do habitual "Vamos almoçar?!", imperava o silêncio. O Pedro já tinha almoçado e os meus companheiros de sofrimento pareciam com vontade de se martirizarem com o cilício por não terem visto a estrela do dia. No caso, o castigo era mais suave, na forma de jejum prolongado. Eu é que não tinha nada a ver com isso e comecei a mandar algumas indiretas do tipo "pensei que vinha almoçar e afinal ainda estou aqui" e outras que tais. 

Passado o que pareceu uma eternidade, o Vasco lá teve uma ideia de génio. "Será que o Uber Eats entrega no Carvoeiro?" . E não é que entregava mesmo? E foi assim que se inaugurou uma nova era na observação de aves nacional. Passado meia hora lá apareceu um estafeta. "Algum de vocês é o Vasco?" . Devia ser da fome, do local, ou da situação em si mas, foi das melhores refeições de junk food que comi na minha vida. Não fossem os momentos de bullying por parte dos meus colegas e tinha sido um almoço quase perfeito.

Só faltava o café. O Pedro sugeriu o do outro lado da estrada. Escusado será dizer que só eu e ele é que lá fomos. O Pierre e o Vasco lá continuaram de castigo. Quando voltámos percebemos que, afinal, eram eles que tinham tido razão. Nesse intervalo passou mais uma torda-anã, que ambos conseguiram ver. Não há evidência mas eu acredito neles. É como diz a anedota, para sair o totoloto nós também temos de fazer alguma coisa. Por exemplo, jogar. 

E juro que foi mais ou menos assim que as coisas se passaram. Foram cinco Alle Alle em três dias no Carvoeiro. Claro que há sempre outras histórias no meio da história, mas isso fica para as conversas de café.

#canaldoxofred